Formação docente é com a escola, não para a escola: a lição do 2º Seminário de Integração entre Cátedras de Educação
Por Coryntho Baldez
Foto de abertura:Daniel Gallo
Formação Docente com a Escola: Sentidos, Possibilidades e Desafios. Este foi o tema do 2º Seminário de Integração entre as Cátedras de Educação Básica e Formação de Professores da UFRJ, da UFMG e da USP, realizado no Colégio Brasileiro de Altos Estudos (CBAE/UFRJ), no Flamengo, em 15 de agosto.
O encontro – que reuniu professores, pesquisadores e gestores do ensino superior e da educação básica – ecoou ideias e ações educacionais que valorizam o diálogo e a cooperação entre universidade e escola pública e reforçou a indispensável articulação entre saberes acadêmicos e escolares no campo da formação docente.
A segunda edição do seminário resultou da estreita parceria entre a Cátedra Anísio Teixeira de Formação de Professores (CFP/UFRJ); a Cátedra FUNDEP Magda Soares de Educação Básica, do Instituto de Estudos Avançados Transdisciplinares (IEAT) da UFMG; e a Cátedra Alfredo Bosi de Educação Básica, do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP.
Participaram do evento como expositores: Bernadete Gatti, titular da Cátedra Alfredo Bosi de Educação Básica (IE-USP); Sant Clair Marques da Silva, diretor da Escola Municipal Herbert José de Souza – SMED-PBH; Carmen Gabriel, coordenadora do Complexo e titular da Cátedra Anísio Teixeira de Formação de Professores do CFP/UFRJ (mediação); Júlio Emílio Diniz-Pereira, coordenador acadêmico da Cátedra Fundeb Magda Soares de Educação Básica do IEAT- UFMG; Fernanda Lahtermaher, professora do Colégio de Aplicação (Cap/UFRJ); e Giseli Barreto da Cruz, coordenadora acadêmica da Cátedra Anísio Teixeira de Formação de Professores do CFP/UFRJ (mediação).
Ao final da matéria, disponibilizamos os links, separadamente, para que você possa assistir a cada uma das palestas.
Intercâmbio desafiador
Compuseram a mesa de abertura Ana Ana Célia Castro, diretora-geral do CBAE/UFRJ; Roseli de Deus Lopes, diretora-geral do IEA/USP; Carmen Gabriel, titular da Cátedra Anísio Teixeira; Gisele Barreto da Cruz, coordenadora acadêmica da Cátedra Anísio Teixeira; Júlio Emílio Diniz-Pereira, coordenador acadêmico da Cátedra FUNDEP Magda Soares de Educação Básica; e Bernadete Gatti, titular da cátedra Alfredo Bosi de Educação Básica.
Ao abrir o encontro, a coordenadora acadêmica da Cátedra Anísio Teixeira. Giseli Barreto da Cruz, disse que era um privilégio para a UFRJ acolher o seminário e lembrou que a iniciativa possibilita um intercâmbio vigoroso de reflexões com vistas a uma intervenção pedagógica comprometida com a escola pública, a educação básica e a formação de professores.
“É um desafio pensar como amadurecer e construir uma parceria efetiva de professores e professoras da educação básica e da educação superior comprometidos com a formação de novos professores e de novas professoras”, enfatizou Giseli, que também é Coordenadora de Ações de Formação e Pesquisa do CFP.
Parceria resulta em livro com capítulos sobre as cátedras
Em seguida, Júlio Diniz-Pereira disse que estava ali representando, também, a professora Patrícia Kauark Leite, diretora do Instituto de Estudos Avançados Transdisciplinares da UFMG, que não pode comparecer.
Segundo ele, o que motivou a organização dos dois seminários foi a necessidade da integração de cátedras que atuam no mesmo campo do conhecimento e possuem objetivos comuns. Essa parceria, destacou, já está resultando em ações concretas.
“Teremos agora a publicação de um livro organizado pelo professor Antônio Nóvoa sobre terceiros espaços de formação de professores, com capítulos das cátedras da USP, da UFRJ e da UFMG”, revelou o pesquisador da Cátedra FUNDEP Magda Soares.
Para ele, essa troca de informações é algo extremamente importante para o crescimento mútuo dessas iniciativas vinculadas à educação básica e à formação docente.
Diniz-Pereira ainda elogiou a presença de profissionais da rede pública básica nas mesas de debate: “Não se pode tratar do tema da formação docente sem a participação de colegas da educação básica”.
“Formação de professores é algo de primeira linha”
Bernadete Gatti assinalou que a integração das cátedras adquire uma importância muito grande por criar interfaces e interlocuções no campo da interdisciplinaridade. “Não há nada mais interdisciplinar do que a educação”, enfatizou.
A docente afirmou que tratar desse tema é lidar com uma situação complexa, interativa e interseccionada. E acrescentou que a formação de professores não deveria ser tratada como algo secundário, mas de primeira linha.
“Até porque um professor é o esteio de uma nação, e hoje a gente já pode dizer até de um planeta, porque sem conhecimento não vamos conseguir preservar nossa vida”, sublinhou.
É de grande importância, disse a pesquisadora, discutir tudo isso coletivamente para que se possa criar um conjunto de ideias que tenham impacto e levem a alterações nas atitudes, na própria gestão e no funcionamento escolar.
Ela lembrou que a Cátedra Alfredo Bosi, da USP, tem o nome de um grande professor, que, embora fosse da área de letras e de linguística, sempre se preocupou com abordagens ligadas à educação.
“Os textos dele cutucam assuntos que são muito importantes, desde o colonialismo, a decolonização e aspectos da autonomia científica brasileira”, elencou.
Bernadete ainda saudou a possibilidade de se discutir, no seminário das cátedras, um modo de atuar diferente, com alternativas e soluções que não percam de vista o espírito analítico crítico.
Bernadete Gatti, titular da Cátedra Alfredo Bosi de Educação Básica, da USP: "O professor é o esteio de uma nação". Foto: Daniel Gallo
Carmen: “É preciso pensar um outro vínculo com a escola”
Em sua fala, Carmen Gabriel destacou a importância do encontro de diversos atores que atuam na área para pensar juntos a formação de professores e a educação básica. “A gente sabe que está num país em que essa luta é árdua. Mas vale a pena apostar na escola pública, acho que isso é muito importante”, afirmou.
A docente frisou que esse é um momento valioso do ponto de vista da trajetória de afirmação da formação de professores na UFRJ.
Segundo ela, o fato de existir uma cátedra de formação de professores na UFRJ e de se organizar um encontro interinstitucional de cátedras que pensam formação e educação básica, não “é algo dado na cultura universitária, não é fácil de se conseguir”.
Esse é um trabalho que tem uma faceta quase de militância, afirmou, no sentido de se dar um passo de cada vez, “como registrou a Bernadete”.
De acordo com a titular da Cátedra Anísio Teixeira, é interessante notar que as três cátedras aqui representadas nasceram de formas e modelos muito diferentes: “E cada uma, com a sua potência e suas idiossincrasias, trazem contribuições importantíssimas para avançarmos e pensarmos esse tema”.
Ao refletir sobre o tema em si do seminário, ela salientou que quem trabalha na universidade já está em diálogo com a escola desde sempre. A questão, acrescentou, é mudar o formato desse vínculo.
“É preciso pensar uma outra articulação, em que a universidade não seja quem irá iluminar a escola. A escola não é o lugar da prática, e a universidade não é o lugar da teoria”, ressaltou Carmen, que também é coordenadora geral do CFP.
Para a dirigente, as três cátedras estão pensando em formas diferenciadas de valorização do professor de educação básica como produtor de conhecimento e da escola como espaço de formação.
“É preciso pensar em articulações mais horizontais. Para isso, temos que mexer com muita coisa que não é da nossa alçada, pensar em um sistema de educação que ainda é extremamente fragmentado no Brasil”, realçou.
Segundo ela, para que a concepção de formação de professores que queremos aconteça de forma permanente, como política pública, é necessário, por exemplo, pensar também na carreira e em outras questões afetas à profissão docente.
Ela disse ainda que quando três universidades da dimensão da UFRJ, UFMG e USP pensam conjuntamente essas questões, o peso é grande. “Por isso, a gente tem que fazer e consolidar mais projetos de forma articulada”, conclamou.
“Tenho uma admiração enorme pelo modelo do Complexo”
Em seguida, Roseli de Deus Lopes, diretora-geral do IEA/USP, elogiou a iniciativa de desenvolver atividades conjuntas das três cátedras e enfatizou que os desafios no Brasil são tão grandes que é impossível enfrentá-los separadamente, mas apenas de modo cooperativo e integrado.
“Os institutos de estudos avançados são espaços para estudos e pesquisas com temas que são mais complexos. Precisamos trazer pessoas de áreas muito diferentes e criar repertórios para conseguirmos avançar”, assinalou.
Roseli também enalteceu o modelo de funcionamento do Complexo de Formação de Professores: “Quero cumprimentar aqui a professora Carmen e dizer que tenho uma admiração enorme sobre o conceito e a implementação do Complexo, esse caminho de construção com as escolas”.
Para a pesquisadora, se a universidade dá importância para outras formações profissionais e quer formar médicos e engenheiros, por exemplo, precisa com urgência voltar os olhos também para a educação.
“A docência é uma profissão, e é mais difícil de todas, porque não é só uma questão de adquirir conhecimentos específicos e trabalhar com os alunos. É um processo civilizatório, um processo de socialização na escola”, sublinhou.
Algumas pessoas, disse ela, estavam com a ideia de educar os filhos em casa. “Isso é péssimo. A escola é esse lugar para a gente aprender a viver, respeitando a diversidade do nosso país, a justiça social e a democracia”, salientou.
De acordo com a diretora do IEA/USP, a escola é um lugar que tem que ser valorizado. Roseli pertence a uma área do conhecimento, a Engenharia, que tem possibilitado uma série de transformações, mas, segundo ela, “também têm coisas terríveis, porque a sociedade, as pessoas, não estavam preparadas para tudo isso”.
O papel da escola hoje, frisou a docente, é muito mais relevante do que já foi: “A importância da docência, da carreira dos professores, é maior do que todas as profissões. As pessoas, na educação básica, podem ampliar os horizontes e perceber que existem diferentes caminhos”.
“Formação de professores tem importância revolucionária”
Por fim, a diretora do CBAE/UFRJ, Ana Célia Castro, disse que falaria em nome do Fobreav, o Fórum Brasileiro de Estudos Avançados, constituído por 14 institutos e centros de excelência de universidades brasileiras.
Ela destacou que as cátedras ali presentes vêm promovendo reflexões profundas – algumas há muito tempo – sobre os caminhos da educação básica, da formação docente e da reforma curricular.
“É um caminho que tem como objetivo, através da formação de professores, transformar o ensino brasileiro. Não é rápido, mas não há nenhum caminho mais efetivo do que a formação de professores para a mudança em profundidade da educação básica e da educação em geral”, sublinhou.
Ana Célia lembrou que estudou no Colégio de Aplicação (CAp/UFRJ) e, por isso, valoriza muito a formação dos professores da educação básica. “É graças ao CAp que estou aqui, sei que a formação docente tem uma importância realmente revolucionária”, realçou.
A dirigente destacou, ainda, que continuará a buscar a integração dos centros e institutos de estudos avançados, com a possível incorporação de outras unidades do Fobreav na tarefa que considera primordial: “construir os caminhos da transformação da educação básica e da formação de professores”.
- Palestra de Bernadete Gatti, titular da Cátedra Alfredo Bosi de Educação Básica (IE-USP);
- Palestra de Fernanda Lahtermaher, professora do Colégio de Aplicação (Cap/UFRJ);
