Reforma curricular: II Seminário das Licenciaturas debate conhecimento pedagógico do conteúdo e codocência

Por Coryntho Baldez

Foto de abertura: Daniel Gallo

O II Seminário das Licenciaturas, promovido pelo CFP em parceria com a Pró-Reitoria de Graduação da UFRJ, nos dias 9 e 10 de junho, no anfiteatro da Coppe/UFRJ, teve como eixo central o debate sobre construção do conhecimento pedagógico do conteúdo e codocência, temas essenciais para subsidiar a reforma curricular prevista na Resolução 04/24, do CNE/MEC.

O encontro reuniu professores da educação básica, docentes e coordenadores de cursos de universidades e de instituições parceiras do Complexo de Formação de Professores (CFP), e contou com ampla programação de palestras de professores e pesquisadores da UFRJ e de outras instituições, como o Cefet/RJ e a Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).

Pesquisadora apresenta pequisa sobre desenvolvimento profissional a partir de casos de ensino

A pesquisadora e professora titular da UFSCar, Maria da Graça Nicoletti Mizukami, por exemplo, fez a palestra “Tecendo Tessituras entre Conhecimento Pedagógico do Conteúdo (CPK) e Codocência”.

Após falar sobre os modelos que “dão sustentação teórica e empírica” a processos de construção do conhecimento pedagógico do conteúdo, a pesquisadora apresentou o projeto de pesquisa “Desenvolvimento Profissional Docente na Escola Pública – Casos de Ensino Como Estratégias Formativas e Investigativas”, que atualmente coordena.

Segundo Mizukami, que também é professora da Universidade Mackenzie, o eixo do projeto – financiado pela Fapesp e que conta com a parceria colaborativa entre universidade e escola pública – é a investigação da construção do conhecimento pedagógico do conteúdo por parte dos professores do ensino básico.

“O projeto, que começou em 2023 e vai até 2027, tem a participação de 25 professores bolsistas de duas redes públicas municipais, o CEU/Butantã, de São Paulo, e a escola Angela Zákia, de Campinas, e de sete professores de diferentes áreas do conhecimento da Universidade Mackenzie”, frisou.

Uma das questões formuladas pela pesquisa foi como os participantes transformam os conteúdos de suas disciplinas em conteúdos de ensino. Outra é sobre como os casos de ensino, considerados como ferramentas formativas e investigativas, contribuem para a melhoria do ensino, sob a ótica dos participantes.

“O projeto focaliza os casos de ensino como estratégias formativas na promoção de processos de como os professores aprendem a ensinar e a se desenvolver profissionalmente”, contou.

Serão publicados três livros dos casos investigados na pequisa, sendo que o primeiro está previsto para ser lançado no final deste ano, com 25 casos desenvolvidos pelos participantes durante o ano de 2024.

De acordo com Mizukami, os livros poderão ser utilizados como ferramentas formativas de professores da educação básica e terão acesso livre. Veja a íntegra da palestra da pesquisadora no canal do Complexo no Youtube.

Maria da Graça Nicoletti Mizukami apresentou remotamente a palestra Tecendo Tessituras entre Conhecimento Pedagógico do Conteúdo (CPK) e Codocência

“Momento de pensar uma política de formação de professores”

A mesa de abertura foi formada pela vice reitora da UFRJ, Cássia Turci; a Pró-reitora de Graduação (PR-1), Maria Fernanda Quintela; a coordenadora geral do Complexo, Carmen Gabriel (remotamente); a diretora de ensino do Cefet/RJ, Dayse Haime Pastore; a pró-reitora de Ensino Básico do Instituto Federal de Educação (IFRJ), Alessandra Ciambarela Paulon; e o assessor da PR-1 e dirigente do CFP, Joaquim da Silva.

Ao abrir o encontro, a coordenadora geral do CFP, Carmen Gabriel – que se encontrava em um congresso no exterior –, agradeceu o apoio institucional da vice-reitora, Cássia Turci, e da pró-reitora de Graduação, Maria Fernanda Quintela.

Ela frisou que “esse é um momento ímpar na UFRJ” pela possibilidade de se pensar não apenas um modelo de reforma das licenciaturas, mas uma política de formação de professores para a Universidade.

Em seguida, a pró-reitora de Ensino Básico do IFRJ, Alessandra Ciambarela, após agradecer o convite e lembrar que o Instituto faz parte do Complexo desde a sua criação, ressaltou a atualidade temática do seminário.

“É importante discutir conhecimento pedagógico do conteúdo e codocência em um contexto nacional em que as diretrizes curriculares para a formação inicial e continuada de professores ainda está muito ‘linkada’ a uma reforma educacional extremamente conservadora e tecnicista”, assinalou.

Para Alessandra, o momento é crucial para que se possa fazer uma discussão não só da realidade da formação docente no país, mas também apresentar propostas para a revisão das diretrizes curriculares da educação básica e, em particular, da educação profissional.

“Querem encher as salas sem pagar um salário digno”

A diretora de ensino do Cefet/RJ, Dayse Haime Pastore, disse que a discussão sobre formação de professores vem desde 2015.

“Passamos por várias normas e resoluções, mas esqueceram que formação de professores é muito mais do que conteúdo, o país tem que olhá-la com um pouquinho mais de cuidado”, frisou.

Segundo Dayse, enquanto não se melhorar os salários em sala de aula não será possível uma política de formação satisfatória: “Querem encher as salas de alunos de licenciatura, só que não dizem que eles não vão ter um salário digno quando se formarem”.

Em seguida, a pró-reitora de Graduação da UFRJ, Maria Fernanda Quintela, afirmou que o momento é especial para discutir as várias questões em pauta ligadas às licenciaturas e destacou a necessidade de construção conjunta de propostas.

Ela defendeu a necessidade de manter a atual relação entre Complexo e a PR-1 e de avançar no sentido da integração no campo da formação docente: “Não podemos deixar de estar integrados numa política institucional para o Brasil, tão importante para todos”.

Maria Fernanda assinalou que vivemos no Brasil, hoje, um momento complexo em relação à política educacional do governo e suas respectivas normas sobre licenciaturas e avaliação geral dos cursos do ensino superior.

Segundo ela, na UFRJ, dada a grandeza e a quantidade de licenciandos e docentes envolvidos na formação dos nossos estudantes, é necessário agilidade para construir essa nova política de formação docente.

Para a dirigente, o maior desafio que a PR1 enfrenta, no momento, é promover uma reforma curricular, em prazo relativamente curto, que efetivamente atenda tanto aos objetivos da legislação como da UFRJ, e que leve em conta a importância de “ser professor na sociedade contemporânea”.

Cássia Turci: “A realização de debates sobre as licenciaturas contribui para valorizá-las”

A vice-reitora da UFRJ, Cássia Turci, lembrou que quase 20% dos cursos da UFRJ são de licenciatura e realçou a necessidade de valorizar os atuais e futuros professores da educação básica.

Ela também defendeu a necessidade de melhorar a remuneração e as condições de trabalho dos profissionais do ensino básico: “Muitas vezes, eles trabalham em três ou quatro escolas diferentes para ter um salário razoável, né? Não vou nem falar um bom salário”.

A dirigente considera, contudo, que há avanços e disse que a realização de debates na UFRJ sobre as licenciaturas, a partir das iniciativas do Complexo, tem contribuído para valorizá-las.

“Eu me lembro quando professores não queriam dar aula nos cursos de licenciatura, pois o consideravam de menor qualidade. E isso mudou, estamos falado mais em política de formação de professores”, frisou.

Cássia elogiou o programa Pé-de-Meia – criado pelo governo federal para promover a permanência e a conclusão escolar de estudantes do ensino médio – mas defendeu a manutenção do PIBID (Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência): “É um programa diferenciado para nossos estudantes”.

A vice-reitora disse, também, que uma das saídas para superar a desigualdade no Brasil é investir na qualidade da educação. Para ela, a insuficiência orçamentária afeta todos os níveis de formação, inclusive o ensino superior público.

“A gente vive isso também nas nossas universidades. Temos passado por situações difíceis, principalmente na infraestrutura física”, criticou.

Ela lembrou que a UFRJ e outras instituições federais de ensino superior oferecem cursos com notas altas na avaliação do MEC, mas se ressentem de maior investimento orçamentário.

Para Cássia, é necessário investir mais tanto na infraestrutura física da universidade pública como no aprimoramento das políticas de formação inicial e continuada.

“CFP entende a docência como profissão”

Após a abertura, o coordenador de Relações Internas do CFP, Joaquim da Silva, fez uma exposição sobre a Resolução 04 , do CNE/MEC, de 29 de maio de 2024, que estabelece as diretrizes para a reforma curricular das licenciaturas, com prazo obrigatório de conclusão até 30 de junho de 2026.

Na ocasião, ele também abordou um documento mais recente e menos conhecido do mesmo órgão, o Parecer 05, editado para explicitar pontos ainda ambíguos da resolução anterior.

Um ponto que gerou polêmica, disse, foi o fato de a Resolução 04 ter definido diretrizes curriculares apenas para a formação inicial de profissionais do magistério da educação básica.

“A resolução não trata da formação inicial e da formação continuada de forma integrada, o que retrata uma política do MEC de fracionar, de entender de formas diferentes essas formações”, frisou Joaquim, que também é assessor da Pró-reitoria de Graduação (PR-1) da UFRJ.

Outra questão importante, segundo ele, é a discussão em torno dos modelos de formação em nível superior que existem no mundo: “Sabemos que existe um movimento para tirar a formação de professores da universidade, como na Inglaterra, e esses modelos têm sido muito ruins”, criticou.

O coordenador do CFP assinalou que a discussão sobre reforma curricular é essencialmente política, não administrativa, e que não se se trata de definir onde alocar uma disciplina ou outra.

“Essa discussão envolve também a defesa de que essa formação seja feita em nível superior, dentro do ambiente universitário”, realçou.

Joaquim destacou, ainda, que o CFP entende a docência como uma profissão e as licenciaturas como cursos de formação de profissionais com saberes específicos relacionados ao magistério da educação escolar básica.

“Estamos formando profissionais para atuar na escola de educação básica? Essas coisas parecem às vezes óbvias, mas elas precisam ser ditas, porque muitas vezes não são bem compreendidas, até mesmo dentro das nossas instituições”, salientou.

No canal do Youtube do Complexo, você pode acessar, separadamente, todos os vídeos dos debates e palestras ocorridos nos dias do evento.


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